Na charmosa região da Savassi, em Belo Horizonte, o consultório do psicólogo Rafael Schieber reflete sua abordagem clínica: sóbrio, acolhedor e silencioso. Ao entrar, somos recebidos com um café forte e um sorriso calmo. Rafael é conhecido por escutar os dilemas mais íntimos de executivos, artistas e empresários que chegaram ao que muitos chamariam de “o ápice”. Mas por trás do sucesso, ele revela um cenário menos comentado — o isolamento emocional que acompanha a ascensão.
A dúvida que mais escuto não tem número: é ‘quem está aqui por mim e quem está aqui pelo que eu tenho?
EgoBrazil: Rafael, o que leva uma pessoa bem-sucedida a se sentir tão só?
Rafael Schieber: O sucesso mexe com a geometria emocional da vida. Ele não só reorganiza as relações pelo excesso de compromissos, mas instala uma dúvida silenciosa: “Essa pessoa gosta de mim ou do que eu posso oferecer?” Quando alguém se torna um polo de influência — seja por dinheiro, fama ou prestígio — sua presença vira uma moeda de troca. A conexão se torna suspeita. E, aos poucos, o afeto que chega parece mais estratégico do que genuíno.
Reflexão do jornalista
O topo, antes símbolo de conquista, parece trazer uma sombra incômoda — a desconfiança. Quem está ali por você, e quem está por aquilo que você representa?
EgoBrazil: Isso é paranoia ou tem fundamento?
Rafael Schieber: Tem muito fundamento, infelizmente. O poder altera a dinâmica das relações. A psicanálise nos mostra que o sujeito começa a desaparecer atrás do “personagem” que construiu. A fama, o status, transformam interações simples em negociações silenciosas. Quem está no topo desenvolve um radar emocional permanente, tentando diferenciar afeto de interesse. Isso desgasta. Cria uma vigilância crônica sobre as intenções alheias.
EgoBrazil: E há culpa nesse processo?
Rafael Schieber: Sim. A culpa por ter ascendido. É como se, ao conquistar algo, a pessoa abrisse mão de vínculos afetivos. Começa a se perguntar: “Ainda sou da minha origem?” ou “Me afastei por escolha ou por sobrevivência emocional?”. Essa culpa vira um afastamento silencioso. Um isolamento que não estava no plano.
A vulnerabilidade virou luxo para quem vive em constante performance
EgoBrazil: Como identificar relações que são genuínas?
Rafael Schieber: Olhe quem estava ali antes do sucesso e quem continua mesmo quando você não tem nada a oferecer. Relações verdadeiras não operam sob lógica de lucro. Elas têm imperfeições, mas são consistentes. Uma vez, uma cliente me disse algo que nunca esqueci: “Confie em quem consegue te criticar e te elogiar com a mesma facilidade.”
EgoBrazil: E os relacionamentos amorosos? Sofrem também?
Rafael Schieber: Sofrem profundamente. O amor pode virar transação. “Será que ela me ama por mim ou por minha posição?” Esse tipo de dúvida corrói a intimidade. E mais: quem vive no topo costuma assumir o papel de liderança constante — o que impede entrega genuína. A vulnerabilidade vira luxo, quando na verdade é necessidade humana.

Reflexão final do repórter
Entre conquistas e cifras, o que era promessa de plenitude se torna, muitas vezes, uma prisão emocional. Talvez o maior desafio não seja chegar lá — mas manter a sanidade e os afetos intactos no caminho.
EgoBrazil: Existe saída para esse tipo de solidão?
Rafael Schieber: Existe, e começa com coragem. A coragem de se mostrar humano, de não deixar que o sucesso defina quem você é. É preciso revisitar medos, inseguranças, afetos que ficaram congelados. Construir vínculos onde você possa existir sem negociar sua essência. O sucesso não precisa significar solidão. Mas exige reconexão com o próprio eu, não só com o que foi conquistado.
EgoBrazil: Para fechar: o que diria a quem, mesmo cercado de pessoas, sente-se profundamente sozinho?
Rafael Schieber: Eu diria que esse sentimento merece escuta. Ele não é sinal de fraqueza, mas um convite à autenticidade. E, se a dúvida persistir, vale lembrar algo essencial: quem você é vale mais do que aquilo que você representa. Só reconhecendo isso é possível construir conexões verdadeiras — fora da lógica da performance.
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